ARABESQUE

ARABESQUE
Em passos de arabesque escrevo

22.8.10




invasão

sou tua
da pele que registra
lembranças a sentir-te o sabor
presente em minha língua

do que em nós era acalanto
mesmo apenas palavras
a me apagar as rupturas

do que me envolve e continua a transbordar
opondo-se aos nãos dos devaneios
em meio às tardes mornas aliciando sonhos

do desejo intenso com que te respiro pelas noites
querendo-te sempre, as pernas entre as minhas
do que ainda é arrepio quando a lembrança seduz

das pequeninas coisas tuas que sempre serão minhas
da tua voz que me invade os pensamentos
do que poderia ser diferente

©Jade Dantas

6.8.10




do que restou


minha poesia
é a canção do que restou

a essência revisitada
na lembrança da tua pele

te escrevo e nem sabes
da vastidão

os nossos olhos agora
não miram mais a mesma direção


©Jade Dantas


cenários


minha palavra é a miragem
que sussurra no olhar

nela busco os reflexos dos abismos
a adrenalina arrepiando a pele

surgindo na madrugada
viajante inesperada

deslumbrada
reconstruindo cenários


©Jade Dantas



poema clandestino


inconscientemente
clandestinamente

antes de adormecer
falo teu nome sem sentir

és parte da minha linguagem
e por não estares comigo de verdade
poema, adormeces comigo

no sonho regressas em ardências
e mergulho no teu sorvedouro
lembrando que vivo


©Jade Dantas

24.7.10




vida nossa de cada dia



instigo a vida
à luminosidade das coisas
às ousadias

e ela me desafia
às escaladas dos caminhos
aos abismos

à utópica liberdade
festa onde somos penetras
presos ao que nunca passa

porque viver é um filme leve
e na liquidez das horas
é uma arte diária


©Jade Dantas

18.7.10




palavras


atravessando espelhos
do profundo ao raso

podem ser poesia
ou pedra compacta

fronteiras do asfixiado
vorazes, amordaçadas

como calar palavras não ditas
se o silêncio é feito de gritos?


©Jade Dantas

16.7.10




panorama


quero-te semeador do imaginário
percorrendo meus caminhos

escalando montes, esculpindo pontes
sobre oceanos

amanhecendo todos os dias
nos meus cenários

e iluminando a travessia
com poesia

©Jade Dantas



trem-bala


morreu o tempo das manhãs
do amor tecendo brisas
sob as folhas silvestres das palavras

é o tempo da indelicadeza
o amor sem infância corpo morto
mito desafinado

faminto encarcerado humilhado
onde o milagre do semear?
o solo é árido

as janelas estão fechadas
as distâncias encurtadas
desnecessários caminhos

o amor é um trem-bala

@ Jade Dantas



©Jade Dantas



declaração de vício


meu vício
justapõe montagens atiçadas na pele

porém declaro, para todos os fins
meu desejo de paz

levanto os olhos, crio asas
voar não dói. recolho imagens
respiro novas palavras, sinto-me curada

mas se vejo teu retrato
o vício retorna aos gritos
sem aviso prévio

e declaro, para todos os fins
continuo viciada

©Jade Dantas

10.7.10




quase nada


acordes imprevistos
submersos
melodiando as madrugadas

distantes
música vestida de ausência
quase nada

melodia inacabada
que me espreita
vaga e irreal

©Jade Dantas

5.7.10




pico do Jabre

na magia do cenário imperturbável
por encostas, pedras e paisagens
exibindo-se à platéia dos seus vales

na força dos impovoáveis ermos
o pico do Jabre é ousadia e força
mesmo submetido às afrontas

de humilhantes feridas de antenas
cravadas pela insensibilidade
de políticos levianos e covardes

poluindo o mais belo monumento
o ponto mais elevado do estado
e aos paraibanos de mãos atadas

paralisados ante o poder do governo
sobra a angústia em olhos de noite
fincados na bandeira do ultraje


©Jade Dantas



renascimento


o prazer do caminho é voraz
seguir sem limites
sem a angústia de ausências

a poesia reencontrada
no limiar das águas
dizendo sim à vida

a tristeza diluida
a lua a falar de poesia
existir é desejo de infinito

©Jade Dantas

4.7.10




quase

na solidão do tempo esgotado
mergulhou

desnuda e desamparada

em busca dos abismos ocultos
do nada


© Jade Dantas

27.6.10




poema


me olhas com olhos de me despir
e revelar minha indecência

escreves teus desejos
no livro aberto do meu corpo

percorrendo letra por letra
os poemas que ali escreveste

acaricio as páginas e a minha mão
esfomeada é o teu corpo que me cavalga


©Jade Dantas

25.6.10




amargor


isenta de mim
na interseção do sonho e do amargor

perplexa
frágil e tarde demais

imóvel

sou um ponto vazio e opaco
atrás da cortina do que não foi


©Jade Dantas



Barreira que rompe+chuva forte=destruição igual a tsunami. Palmares e adjacências, aqui em Pernambuco, e União dos Palmares e adjacências, em Alagoas, estão quase completamente destruídas. Foi um horror o que aconteceu em nossas terras pernambucanas na semana que passou.
No link, algumas fotos de Palmares que saíram no jornal.
Este ano, os festejos de São João, com shows e artistas programados pela Prefeitura, são máscaras forjadas para iludir o povo com teatro e pão.
Jade


http://www.flickr.com/photos/jconline2/sets/72157624194062069/show/




tendências



se esperar até amanhã
quem sabe, a dor se acalme

quem sabe, perca-me de mim
afinal é feriado nacional

o Brasil joga,
quem sabe?


Jade Dantas

20.6.10

"PORQUE A VIDA, A VIDA, A VIDA, A VIDA SÓ É POSSÍVEL REINVENTADA"
Cecília Meireles



quem sou?


sou uma curva no tempo
não me enquadro aos roteiros

do convencional
brinco com as estrelas

danço na superfície da lua
prefiro a audácia à monotonia

amo criar do nada
a canção inusitada, as tangentes

os trilhos invisíveis
meu caminho é o impossível


©Jade Dantas

7.6.10




rituais


para a sede
que não cabe no poema

máscaras irracionais
em busca de sentido
em busca de vida

©Jade Dantas


imagem de Picasso

1.6.10

DÁLIA



Quando chove, lembro a Dália. Brincávamos que era movida a eletricidade, parecia brotar em toda parte. Vivia se propondo a entrar numa dieta que nunca começava. Mas era gulosa, comer lhe dava prazer. Na noite da enchente que levou quase tudo, a procuraram no pavimento superior da casa onde deveria estar dormindo. No térreo já havia água na metade da escada. Teria saído na madrugada, com aquela chuva? Desceram, foram à rua, nada.

Pela manhã, quando a água baixou, a encontraram na cozinha. Plantada na lama, a mão segurando a porta da geladeira. Não precisava mais se preocupar com a dieta.


©Jade Dantas



circunstâncias


arquivo palavras
de desapego
para explicar-te

mas desafias o tempo
e estás inteiro como te sei
como me sabes


©Jade Dantas



tempo de germinar


talvez seja o tempo
da germinação. voz, olhos, mãos
brotando do campo de silêncios

captando o instante
anunciando novas flores
entre folhas de outono

tempo de frutos, cores
recapturando as seduções
brotando de antigas raízes


©Jade Dantas

26.5.10




FATALIDADE


Por esse encontro e essa intensidade, percorreríamos o mundo inteiro.
Pareciamos prever, desde sempre, da imensidão contida no amor e seu caráter de urgência. Urgência que não saberiamos colocar em palavras.
Saber da música orquestrada antes de nós a esperar-nos.
Quando imaginavamos uma vida inteira, a fatalidade destruiu os castelos, o amor fluindo pelos dedos, o tempo orquestrando os cenários da vida.


ãJade Dantas

24.5.10




evasões


por falta de jeito
revisto-me de evasões

crio algo psicodélico
um código metafórico

construo cenários sem nome
de antigas perturbações

faço novas abordagens
emolduro a vida em poesia

e reconstruo a nós dois -
o bandido e a mocinha


©Jade Dantas

20.5.10




diferenças


o vida te fez rocha
fortaleza muralha

sou a água sinuosa
que desliza ao teu lado

és puro aço
esquecido de doçuras

sou a volúpia das ondas
convidando ao mergulho

te cristalizas fechado
sou oceano revolto

és penhasco és abismo
eu sou um pássaro livre

és limite sem parágrafo
sou vôo ilimitado


©Jade Dantas

18.5.10




don't stop


escolho as intenções como bandeiras
subindo montes, quebrando barreiras

escolho a curva do horizonte
em vez da estrada reta

em vez desta noite tão imensa
de tanta ausência, escolho a intempérie

©Jade Dantas

16.5.10




calmaria


por trás da dor que se esconde
abrem-se janelas

redescobrimos o sol e o luar
lá fora há um novo dia

é o tempo exato de ressurgir
de se deixar embalar


@Jade Dantas



manipulação


direi sempre não aos horizontes restritos
da manipulação

sempre - nunca mais!
à alma fraturada

quero a voragem
a emoção partilhada do delírio
quero o mel e o sal


©Jade Dantas



braços abertos


sou nuvem, sou rio solto
reinvento minhas margens

lanço-me das montanhas
sem prisões e sem barragens

vôo mãos dadas com o vento
vôo de braços abertos

minha mente é meu refúgio
onde me escondo em palavras


©Jade Dantas



reconstrução


se teu amor foi insuficiente
e as emoções precárias

se os teus beijos
e tua voz a me falar – te amo

foram finitos como o dia
te reconstruo em novas palavras

com poesia


©Jade Dantas



confissão


nunca estou completa para a vida
meu caminho é tela nua e branca
onde me escrevo dia a dia

o amanhã é uma promessa vã
no hoje sou poesia
e o amanhã é fumaça densa

de perguntas sem morada
peregrinando eternamente
para o final


©Jade Dantas



cores de maio


redescubro o azul
nas cores de maio

na doçura de maio
nos gestos de maio

nos sorrisos de maio
meu corpo é de infinito

e o amor é encantado
na poesia de maio


©Jade Dantas

12.5.10




esfinge


não me procures
na curva dos meus ritmos
onde o tempo me perdeu de mim

quem sou é um contorno no infinito
um vulto que sumiu no corredor
mascarando a outra que ainda sou


©Jade Dantas

10.5.10




desatino


restou-me a certeza da essência
sobrevivente além do tempo

em algum recanto da alma
adormecido e resgatado

por desatinadas madrugadas
contra o ritmo implacável dos dias

mas “ eu te amo” não alcança a mão humana
e não se deleta o tempo do milagre


©Jade Dantas

9.5.10




noite


nas rotas despedaçadas
dos caminhos sem retorno

sem futuro e sem amarras
a noite recomeçava


©Jade Dantas

7.5.10





a cada vez


conduzo teus olhos, reflexos
num espelho

na ressonância das palavras
em cada poema que escrevo


©Jade Dantas




fuga


porque estás nos meus sonhos
e a saudade da tua ternura
me embaça os olhos

matarei o desejo
moldando-te aos meus dedos
e apaziguando a loucura


©Jade Dantas



sítio do meu avô


sertão. noite de inverno
luz de lamparina. interior
sítio do meu avô. cai uma chuva fina
mulherada reunida na cozinha

tomo café e escuto a observação
feita pra mim, moça da cidade
- não venha aqui de madrugada
- por quê? - melhor num vir

(sorrisos misteriosos) - sei
(querem me pegar!)
- fantasmas? (rio) - como sabe?
agora rio alto sem pensar

elas calam. suspiram
- desculpem-me - não quero chatear
- tudo bem, imagina!
porém, na madrugada, a fome bate

no meio do creme de abacate
olho de lado e fico estática:
bem junto a mim, um arlequim
enorme, olhar zombeteiro

na pia um vulto estranho
brota do ralo. tremedeira
fujo, vou me deitar. nossa! sítio, interior
nunca mais! sou da cidade!


©Jade Dantas



embriaguez


beber-te em taça de cristal
o calor a me subir no corpo
teus olhos a me aquecer a alma

beber-te e me embriagar do teu vinho
a língua acalentando teu sabor
no silêncio da noite apaziguada


©Jade Dantas



não se esquece


o mar revolto do teu corpo
já habitou minha pele

e do mar não se esquece

mesmo que passem mil anos
não se esquece o mar

o fulgor incontrolável
os murmúrios de ondas

o sabor das águas
que ainda me levam a naufragar


©Jade Dantas



desencanto


entre emoção, repúdio, dor
e olhos de espanto

nos perguntamos desencantados
- Para onde foi a humanidade

das nossas autoridades?
desgastada por pedras e sombras

a poesia repete angustiada
- Senhor, se somos brasileiros e irmãos

para onde foi banida a honestidade
dos nossos representantes do Estado

em cujas mãos confiamos o país
hoje perdido em miséria e fome?


©Jade Dantas



tempo


porque eras a presença tão sonhada
e porque era o tempo de amar

e me trouxeste teus olhos de perguntas
cortinas abertas à vida e à luz

pisando o firmamento, braços abertos
fui te encontrar

porque chamaste com voz de ansiedade
e porque eras o amor tão sonhado

inteira, sem medo da dor
fui te encontrar


©Jade Dantas



intocáveis


convidam-me e fogem intocáveis
na densidade com que me provocam
e calo com medo do delírio

falo das palavras que me escondem
falo dos sonhos indevassáveis
falo do refúgio inconfidente

em meu continente selvagem
falo de poesia e de metáforas
falo de ti


©Jade Dantas



espaços ausentes


seria apenas num retrato
catalogado no tempo
onde existes de verdade?

por densas lembranças
espaços ausentes
atravessando noites

ou apenas um retrato
reinventado
apenas meu


©Jade Dantas



murmúrios


invento palavras
sem sentido

os sons, os murmúrios
e a dança do amor

invento teus dedos
o toque das tuas mãos

invento teus beijos
os desejos dos teus olhos

no meu corpo que palpita
reinvento a ti


©Jade Dantas



valerá a pena


enquanto o vento trouxer a música
da chuva, o cheiro da terra molhada
os ciclos da natureza nas madrugadas

enquanto houver luar, o amor for um riso
de fonte na lembrança e em algum lugar
tivermos um abraço, um sorriso, um amigo

valerá a pena ter amado
valerá a pena ter vivido


©Jade Dantas



a voz do poema


desejaria tocar-te
mas que o faça o poema
de forma definitiva

que te acaricie
música a deslizar
dizendo-te, antes que te diga

do que sou
meus recatos, desacatos
antes de mim

que te leve este amor


©Jade Dantas

6.5.10




incoerência


a memória dos instantes
surge, reabre feridas

(nunca cicatrizaram na verdade)
um olhar, uma canção

colorindo de azul a incoerência
(nunca mais nos tocaremos!)

feita de ausências
a eternidade se estende à minha frente


©Jade Dantas



doçura


esqueço as armaduras
o tempo do sal
o romantismo confiscado

e entre a dor e a doçura
sou aprendiz de azul
redescobrindo a vida


©Jade Dantas



escolha


jamais te direi
mas eu te amo

com olhos de enxergar somente
o azul sem parâmetros

com mãos de recosturar a vida
esquecer noites em claro

a ausência do abraço
em infatigáveis asas de ternura

escolho amar sem nada pedir
todos os desertos a atravessar

com este renitente amor de eternidade
que nem sabes


©Jade Dantas